Suspensão do Julgamento pelo STF sobre Responsabilização de Jornais por Falas de Entrevistados

O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu em 7 de agosto de 2024 o julgamento de dois pedidos que visam restringir a tese que admite a responsabilização de jornais por declarações de entrevistados. O ministro Flávio Dino pediu vista, interrompendo o andamento do julgamento.

Em agosto de 2023, o STF determinou que veículos de imprensa podem ser responsabilizados civilmente por injúria, difamação ou calúnia proferida por terceiros no RE 1.075.412. Esse entendimento foi aplicado no caso do Diário de Pernambuco, que foi condenado, e na Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que interpôs embargos de declaração.

Os embargantes argumentaram que a tese de repercussão geral fixada pelo STF contém trechos genéricos, podendo levar a interpretações abrangentes e problemáticas nas instâncias inferiores. Na prática, isso poderia facilitar o assédio judicial contra jornalistas e fomentar casos de censura prévia, uma vez que veículos de comunicação poderiam optar por não publicar conteúdos de interesse público devido ao medo de represálias.

Análise dos Pedidos

O relator do caso, ministro Edson Fachin, admitiu apenas o pedido do Diário de Pernambuco, aplicando o entendimento do STF de inadmitir embargos de amicus curiae, como foi o caso da Abraji. Fachin também rejeitou o pedido do Diário de Pernambuco contra a condenação no caso concreto, mas votou por alterar a tese, considerando os pontos levantados pelos embargantes e outros amigos da corte.

Alterações na Tese

Fachin propôs as seguintes alterações na tese original:

1. Remoção de Conteúdos: O relator retirou o trecho que admitia a remoção de conteúdos de jornais.

2. Indícios Concretos e Dever de Cuidado: Fachin removeu trechos que permitiam a responsabilização de veículos de imprensa caso houvesse “indícios concretos” de falsidade da imputação ou se o veículo não observasse o “dever de cuidado” na verificação da veracidade dos fatos.

3. Entrevistas ao Vivo: Adicionou um ponto afirmando que, em caso de entrevistas ao vivo, os veículos não podem ser responsabilizados por “ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime”. Porém, o jornal deve garantir “direito de resposta, em iguais condições, espaço e destaque” ao acusado, sob pena de responsabilização.

Impacto e Considerações dos Ministros

Flávio Dino

O ministro Flávio Dino pediu vista para analisar mais profundamente dois pontos específicos: a questão dos “jornais de ocasião”, criados exclusivamente para produzir entrevistas difamatórias, e a remoção do trecho que admitia a retirada de conteúdos. Dino destacou a preocupação com a existência de veículos criados na internet apenas para difamar, inclusive com entrevistas encomendadas.

O ministro Alexandre de Moraes, por seu turno, concordou com Dino, afirmando que há uma espécie de “lavagem de notícias”, onde sites, blogs e serviços de streaming divulgam notícias falsas utilizando exclusivamente falas de terceiros. Moraes ressaltou a necessidade de considerar a remoção de conteúdos ilícitos para não perpetuar a difamação na internet.

Tese de Repercussão Geral Proposta por Fachin

Fachin propôs uma nova formulação para a tese de repercussão geral:

“A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia. Admite-se a possibilidade posterior de análise e responsabilização em relação a eventuais danos materiais e morais. Isso porque os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.

Na hipótese de publicação de entrevista, por quaisquer meios, em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se comprovada a sua má-fé caracterizada pelo dolo direto, demonstrado pelo conhecimento prévio da falsidade da declaração, ou ainda por dolo eventual, evidenciado pela negligência na apuração da veracidade de fato duvidoso e na sua divulgação ao público sem resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório pelo veículo.


Na hipótese de entrevistas realizadas e transmitidas ao vivo, fica excluída a responsabilidade do veículo por ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime, devendo ser assegurado pelo veículo o exercício do direito de resposta em iguais condições, espaços e destaque, sob pena de responsabilidade nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal.”

Considerações Finais

O julgamento ainda está em curso e a decisão final sobre a responsabilização de veículos de imprensa por declarações de entrevistados poderá trazer importantes implicações para a liberdade de imprensa no Brasil. A revisão da tese inicial pelo ministro Edson Fachin mostra uma tentativa de equilibrar a proteção à liberdade de imprensa com a necessidade de evitar abusos e difamações, ao mesmo tempo em que considera a realidade dos veículos de comunicação modernos e as práticas na internet.

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